Uma boa limpeza pode demonar anos para começar e longo
tempo para terminar. A gente fica lembrando dos detalhes, dos momentos bons ou
ruins; são momentos de nossa jornada que parecem reviverem com nossas
quinquilharias. Lembranças são sempre lembranças, so existem em nossa mente,
mas sobrevivem em nossos sentimentos. E chave da porta das lembranças estão
guardadas pelos cantos de gavetas, dentro de caixas de sapatos, cujos sapatos
ja se foram há tempos, em páginas daquele livro que não terminamos de ler, em
cadernos guardados “de lembrança” principalmente quando tem o autógrafo de
todos os colegas de curso, e principalmente no mais especial estojo denominado album de fotografias.
As fotografias são chaves por excelencia para
eternizar os momentos importantes, registrados, instantaneados naquele pedacinho
de papel que guardamos em belos albuns. Reliquias de Familia. Algumas são
cortadas, ou eram quando o casal se separava, o namoro terminava... e se
devolvia a foto do(a) ex! Antigo não? Pois era assim no tempo de minha mãe: a
celebre frase: “Me devolve as fotos que te entrego as cartas”; caso esta ameaça
não surtisse efeito, tudo viraria cinzas e com estas, o romance estava
definitivamente acabado. Bem, mas as lembranças permaneciam, talvez trancadas
para sempre dentro de um coração ferido.
Contudo somos feitos de carne, ossos e sentimentos e
nosso passado muitas vezes nos parece mais vivo que nosso presente. Esta é a razão
de muitos sabios aconcelharem a se viver no presente, largar o passado, deixar
la tras... por que?
O porque eu realmente fico a me indagar. Se o passado incomoda,
se as tristes lembranças incomodam, então as boas tambem incomodam? Se o
passado não existe mais, então por que guardamos as lembranças, se não em
objetos materiais, com certeza dentro de nossas cabeças e corações? Quaisquer
que sejam, boas ou ruins, se deixarem de existir, nos tambem deixamos, ou não? O
que seria da minha vida sem as lembranças do passado?
Voltando às minhas gavetas, ao porão das minhas
lembranças...
Eu estava aqui,
organizando antigos arquivos e revirando assim o passado.
Encontrei umas fotos não tão antigas, mas me detive
olhando para pessoas que não vejo ha muitos anos. Algumas me trouxeram boas
recordações, outras porem tristes e decepcionantes. Parei com tudo...
Observei longamente aquela fotografia. Deleto ou não?
(vivo na era digital)- deletar corre sempre o risco de perder, então mando pra
lixeira. Pode ser que depois eu queira reconduzir o arquivo ao seu lugar
anterior... ou não. Em algum momento vou exvasiar a lixeira e com isso todos os
arquivos irão embora para sempre. Vou conseguir exvasiar a lixeira da minha
cabeça tambem?
Sempre ocorre essa dúvida, não é mesmo?
Decidi que aquilo que imediatamente eu não deletava,
ficaria no mesmo lugar por mais algum tempo até que a vontade de jogar fora fosse
totalmente livre e imparcial, assim tirando primeiro do meu coração e da minha
cabeça como algo incrivelmente sem importancia por terem outras mais
importantes para lembrar.
A gente sempre quer jogar fora aquilo que magoou ou
que ainda doi, um pequeno prego incomodando no coração. Mas se desfazer de um
objeto, uma foto, quando a lembrança por si só ainda doi, com a intensão de
parar a dor, é a mesma coisa que tomar um analgesico sem tratar a doença. Um
belo dia a dor volta a incomodar mesmo que a chave da lembrança tenha sido
exterminada de nossas vidas.
Então fiquei ali, olhando aquela fotografia, deixando
me alimentar de toda dor que eu pudesse sentir. Perece masoquismo! Mas não é.
Encarar a dor de frente. Encarar a magoa de frente.
Ficar ali com ela e buscar suas causas, onde esta o erro, por que ainda
sofremos, o que nos faz sofrer... por que ainda sofremos se tudo ja passou? ...
Isso! Por que eu ainda sofro com essa lembrança se tudo ja passou?
Por que fico aqui revivendo o fato com a mesma magoa,
com o mesmo sentimento?
Se essa pessoa que me causa sofrimento estivesse aqui
agora, diante de mim?! E tivesse muito a dizer, coisas que nunca ouvi ou nunca
quis ouvir. Ou se o fato que me doi não aconteceu realmente desse jeito?
Desculpar é tirar a culpa: des- prefixo indicador de
negação; negar a culpa, desculpar!
Não quero desculpar ninguem, muito menos quem me
causou tanto sofrimento. O que eu quero é não sofrer mais. Quero vencer a magoa
que doi e incomoda. Quero sair do desvio do passado, do rancor, do reviver, do
revirar as memorias do passado e sofrer novamente. Eu quero me dar o direito de
recordar do mesmo fato, sem dor, sem incomodo nenhum. Quero ver com outros
olhos, com os olhos do sentimento, do coração.
Entao eu não vou desculpar. Não posso negar a culpa de
ninguem, assim como não posso negar a minha propria. Ou fomos causadores do
dano ou não. E não deixe nenhum filósofo do Direito entrar na conversa que ele
escreve um compendio sobre a culpabilidade.
Eu quero me perdoar por me magoar tanto. Eu quero
perdoar quem me causou tanto dando. Eu quero apenas per-do-ar!
Perdoar: para doar!
Eu não sei como perdoar. Desde pequenina escuto esta frase:”Voce
deve perdoar seu irmão!”- porem ninguem nunca conseguiu me explicar como é que
a gente perdoa.
Ja notaram que ninguem consegue explicar sentimento
nenhum? Como é amar? Como é perdoar? Como é se apaixonar? Como é se
desapaixonar(isso existe?)? Ninguem consegue ensinar a ninguem como sentir? Não
se aprende a sentir. A gente sente ou não.
Nao sei como é perdoar. Então vou ficar olhando essa
foto ate não sentir mais dor. Vou consumir o veneno em pequenas doses ate ficar
totalmente curada.
...
A faxina foi parcialmente terminada e depois de tres
dias retornei ao mesmo ponto.
Durante todo tempo fiquei remexendo a dor, abrindo a
ferida, verificando se ainda sangrava ou se o tempo havia curado tudo por
dentro.
O tempo!
Foi com vontade e me dando tempo para encarar a dor, a
magoa de frente que ela parou de doer.
Desisti de deletar o arquivo por que doia.
Deletei por que eu quero o espaço livre para novas
fotos. Aquela foto não me interessa mais. Aquela lembrança não me incomoda e
não doi mais.
Será isso perdão?
Nao sei.
Verdade é que deletei a magoa do meu coração. E fiz
diversos testes antes de deletar o arquivo.
Foi um grande alivio!
Apenas um clic!
PS.: este texto foi escrito há mais de tres anos
atras. Foi novamente lido e revisado, corrigido e hoje nem lembro mais de que
foto eu estava falando! Assim foi o inicio de uma revisão de todo meu passado,
quando deletei magoas tão antigas que nem sabia que ainda doiam, pois tinha me
acostumado a dor.
Minha atitude diante do que doi hoje é bem diferente. Foi
dificil? Foi! Porem não impossível! E tudo começou quando entendi que somos
seres em aprendizagem, e que o que doi hoje em primeiro lugar fomos nós mesmos
que plantamos o espinho no coração, nos deixamos ferir ou não soltamos aquilo
que nos apegamos. Isso não é amor! O amor é livre!
Revisado em 06.09.15
FzWagner